É preciso priorizar a educação pública de qualidade

É preciso priorizar a educação pública de qualidade

Na última semana, os parlamentares que integram a Comissão Especial encarregada em aprovar o novo Plano Nacional de Educação, na Câmara dos Deputados, se reuniram com o ministro da Fazenda Guido Mantega para tentar chegar a uma conclusão sobre o percentual do PIB a ser investido na educação, na próxima década. O projeto do Governo prevê 7% até 2022, a sociedade reivindica 10% e o Congresso tem indicado 8% (incluindo as verbas públicas repassadas à iniciativa privada).

A postergação do debate sobre o PNE, no Congresso, tem revelado preocupante desinteresse do Estado brasileiro em resolver os problemas que impedem transformar a educação numa política de desenvolvimento com soberania e justiça social. A opção do Governo Federal em priorizar os arranjos educacionais – por meio do PAR e do PDE/Escola, por exemplo – colide com a necessidade de se intervir nos gargalos do federalismo, sobretudo naqueles que inviabilizam a instituição do Custo Aluno Qualidade (CAQ), com a devida responsabilização fiscal, financeira e social de cada ente da federação.

Ainda hoje, na esfera federal, o superávit primário (pagamento da dívida) tem ditado regras para o financiamento das políticas sociais, e os sucessivos contingenciamentos orçamentários depõem contra a necessidade de se aumentar o percentual de investimento na educação pública. De parte dos Estados e Municípios, a pouca transparência das contas públicas, as desonerações tributárias e a excessiva dependência do Poder Central – também explicada por omissões fiscais e por má conduta administrativa nesses entes federados – postergam os avanços educacionais.

O que se vê, nesse momento, é um país com crescimento econômico pujante (6º PIB mundial), porém com uma realidade social ainda subdesenvolvida e com desigualdades latentes – não obstante as políticas de inclusão implementadas na última década. A desigualdade se faz presente em muitas esferas da vida brasileira e expõe a histórica exploração das elites nacionais, apoiadas na estrutura patrimonialista do Estado. Também as heranças tributárias do regime de exceção, assim como as reformas neoliberais da década de 1990, continuam a promover desajustes sociais. E não há como firmar a trajetória do desenvolvimento – perene, democrático e republicano – sem atacar os gargalos do federalismo e do investimento público (necessário) nas áreas sociais.

No caso da educação, os desequilíbrios precisam ser enfrentados à luz do esforço fiscal de cada esfera administrativa, do combate à corrupção e da necessária e urgente reforma tributária (leia-se: partilha de tributos que priorize a equidade social). Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelou que para cada R$ 1,00 gasto em educação, R$ 0,20 provém da União, R$ 0,41 dos Estados e R$ 0,39 dos Municípios, numa relação inversamente proporcional entre a receita de impostos e o atendimento das matrículas (a União arrecada 57% dos tributos, os estados 25% e os municípios 18%). Outro estudo do IPEA mostrou que também para cada real investido na educação, a taxa de retorno é de R$ 1, 80, ou seja, quase o dobro! E pergunta-se: já que a educação apresenta excelente impacto socioeconômico, por que não investir com mais peso nessa política pública?

Fator preocupante, inaugurado com as PPPs (parcerias público-privadas), consiste na transferência das prerrogativas constitucionais do Estado para a iniciativa privada. Na educação essa tendência apresenta-se mais fortemente nas políticas de formação profissional (PRONATEC) e de universalização das matrículas no campo (o PRONACAMPO inclui no Fundo da Educação Básica as matrículas dos centros familiares de formação por alternância), na educação infantil (a creche e a pré-escola prevêem financiamento público para as matrículas privadas no FUNDEB) e na educação especial (onde as matrículas particulares também estão contempladas no FUNDEB em razão da omissão no atendimento estatal).

No que diz respeito ao piso salarial do magistério, quatro questões se mostram cruciais para seu pleno cumprimento na lógica dos ajustes federativos, que requer ainda a constituição do Sistema Nacional de Educação:

Estados e Municípios precisam arrecadar e aplicar corretamente os impostos destinados à MDE (no mínimo 25% das receitas previstas no art. 212 da CF, observadas as regras do art. 60 do ADCT/CF).

Em caso de incapacidade financeira para pagamento do piso na carreira profissional, os entes federados devem comprovar a falta de recurso para que a União efetue a suplementação ao piso.

À União cabe estabelecer critério para repasse das verbas federais aos estados e municípios, sob a perspectiva de valorização da carreira profissional (é preciso definir parâmetros na Portaria MEC 213/11);

Ao Congresso Nacional compete retirar do cálculo da Lei de Responsabilidade Fiscal os recursos de MDE destinados à folha de pagamento da educação (por se tratar de verbas vinculadas constitucionalmente) e de possibilitar o repasse da União para o pagamento do piso aos entes federados que não recebem complementação do FUNDEB, na perspectiva de atingir a meta 17 do PNE.

Os/As trabalhadores/as não têm dúvidas quanto à importância do equilíbrio econômico para a manutenção da renda e do emprego, sobretudo em tempos de crise mundial, mas não podem concordar com políticas de desonerações de impostos que comprometam a capacidade de investimento do Estado. Entre 2008 e 2009, as desonerações para o setor produtivo afetaram gravemente os investimentos em educação, sem que houvesse a devida compensação financeira por parte da União. A subvalorização do piso do magistério, que para a CNTE deve ser de R$ 1.937,26, em 2012, deve-se em parte a esse expediente da política econômica.

Por se tratarem de temas estruturantes, o piso do magistério e o PNE trazem à baila problemas históricos que o país insiste em postergar. Mas é chegada a hora de enfrentá-los, caso desejemos superar o “mais do mesmo” na educação. E a garantia de 10% do PIB para a educação, a instituição do CAQ e o estabelecimento de um regime de cooperação federativa para a educação, é o primeiro passo na direção de uma política de Estado comprometida com a educação pública de qualidade, para todos e todas.

CNTE

 

 

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