Professor propõe desafio para conscientizar pessoas brancas sobre questões raciais: ‘Não existe racismo reverso’

Professor propõe desafio para conscientizar pessoas brancas sobre questões raciais: ‘Não existe racismo reverso’

O professor Alexandro de Sousa, conhecido como Alex da Bahia, lançou um desafio com o objetivo de promover uma reflexão sobre o racismo a partir de vídeos que satirizam situações que fazem parte do cotidiano de pessoas negras.

Alex pediu que amigos e artistas negros gravassem um vídeo abordando uma situação racista, porém com uma inversão de papéis: as vítimas de discriminação seriam pessoas brancas.

Clique aqui e veja o vídeo!

De acordo com Alex da Bahia, a ideia do desafio surgiu a partir de um debate com amigos em um grupo de aplicativo de troca de mensagens sobre os protestos antirracistas que se espalharam pelo mundo após o assassinato do americano George Floyd por um policial branco, nos Estados Unidos.

Os vídeos, então, são uma forma de provocar uma reflexão através da ironia para conscientizar aqueles que acreditam que o racismo não existe. Entre as pessoas que aparecem nas imagens, alguns artistas aparecem como Patrícia Gomes, ex-Timbalada, Lucas Andrade, do Olodum, Sérgio Laurentino, ator, e Marinez de Jesus, ex-banda Reflexus, grupo de maior sucesso da Axé Music na década de 80.

“Como é que um grupo que tem pessoas brancas, e algumas delas não fazem a reflexão do que acontece no dia a dia e dizem ‘ah, isso não é racismo, isso não existe’. Então, a gente teve a ideia de propor um desafio de gravar um vídeo sobre o racismo, porém com a perspectiva inversa”, disse.

As manifestações antirracistas chegaram ao Brasil mescladas com os protestos antifascistas. Além de gritar justiça por George Floyd, os brasileiros choram a morte dos seus próprios negros vítimas do racismo, como é o caso do adolescente João Pedro e da menina Ágatha Félix, mortos durante ações policiais em comunidades do Rio de Janeiro, e do pequeno Miguel, de 5 anos, que caiu do 9º andar de um prédio quando tinha sido deixado pela mãe, uma empregada doméstica, aos cuidados da patroa.

O histórico de luta dos negros no país, no entanto, não é algo recente, tampouco nasceu com os protestos americanos. O Brasil acumula décadas de combate ao racismo, com entidades como a Frente Negra Brasileira, criada em 1931, o Movimento Negro Unificado, que nasceu em 1978, ou o “Reaja ou será morto, reaja ou será morta”, de 2006.

Veja aqui a segunda parte do vídeo que ironiza comentários racistas feitos por pessoas brancas

Na opinião de Carla Akotirene, que é assistente social e doutoranda em Estudos de Gênero, Mulheres e Feminismos pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), a diferença para o momento atual é o poder de amplificação da luta possibilitado pelas redes sociais.

“Eu já percebia essa pauta de forma tão vigorosa como estou percebendo nos últimos dias. A diferença central é que as redes sociais estão fazendo com que essa visibilidade tenha um alcance extra território brasileiro e faça com que pessoas que estão em outro território racista, como os EUA, consigam estabelecer conexões, como, por exemplo, entre o modelo de tolerância zero lá e as críticas que fazemos aqui em relação à polícia”, afirmou.

Alex da Bahia acredita que, de maneira geral, o desafio proposto por ele vai gerar uma reflexão positiva, embora algumas pessoas ainda acionem a carta do “racismo reverso” à discussão.

O professor e militante negro explica porque não é possível pensar o debate racial a partir de uma perspectiva de inversão do racismo.

“Uma pessoa branca me perguntou se isso não era racismo reverso. Eu expliquei que não existe racismo reverso. Pode até haver negros que reproduzam o racismo, mas ele nunca vai ser racista, porque o racismo é um sistema de opressão, e eu não conheço lugar nenhum no mundo em que haja um sistema de opressão feito por negros contra brancos”, afirmou.

Não há como negar que o racismo está pautado com maior destaque na sociedade brasileira, portanto gerou engajamento de pessoas brancas, entre elas artistas e influenciadores, além de algumas marcas.

A pesquisadora Carla Akotirene falou sobre o papel dos brancos na luta antirracista.

“Se a gente quer que a sociedade ganhe outro tipo de letramento em relação às relações raciais, a gente precisa da classe hegemônica socialmente, porque é essa classe que dirige instituições, formulam leis e políticas públicas. Se elas não tiverem acesso aos nossos conteúdos, aos nossos livros, somente nós, negros e negras, iremos consumir algo que a gente já conhece”, disse.

Uma das ações realizadas por artistas e influenciadores brancos de relevância é ceder o perfil em uma rede social para artistas e pesquisadores negros. Carla Akotirene revelou que recebeu esse mesmo convite do ator e humorista João Vicente, que acumula 1 milhão de seguidores, porém não quis assumir a página dele.

Entretanto, João Vicente tem mapeado e compartilhado materiais produzidos pela pesquisadora baiana.

“Eu achei massa porque sai do eixo sul-sudeste. Eu não sou uma pessoa que está chegando agora. Eu já estava. Só que eu estou na Bahia. E a Bahia é o outro do outro. Não só a Bahia, mas o Nordeste. Então, a gente sempre fica com o objeto de fala de São Paulo e Rio de Janeiro e não aparece com a nossa produção intelectual”.

Do G1

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